DIÁRIO ESTUDANTIL
Um sonho vinha lentamente
Ao ver que a minha vida
Mudaria completamente
Busquei a solução preferida
De ser o aprendiz
Onde aquele momento feliz
Na minha ilusão garantida.
Quando os meus olhos
Presenciaram as cenas da lição
Que a mim foi proposta
Deram a chamar de educação
A escola sem memória antiga
Que fez o meu projeto se ampliar
Crescendo em mim mais juvenil
Um coração de criança,
Sou mais um “futuro do Brasil”.
As pessoas ao meu redor
Incrédulas, mas com ilusão
De ver que o meu mundo
Era amplo, cheio de sensação
E quanto mais eu observava
Aqueles aprendizes sem profissão
Mais e mais eu ganhava
Um lugar em seu coração.
Alguns eram conformados
Outros sem perceber a realidade
Influenciados pelos vínculos
E veículos padronizados
Fazendo do seu mundo
Um país de atormentados.
Eu, um estranho por ali
Entre os jovens em revolução
Os mestres disfarçados
Sem projetos em construção
Monótonos e sem precaução
Aderindo a valores aprendizes
Do seu fracasso em transformação.
Ganhava a cada dia
Uma garantia de vencer
Mesmo neste mundo de fantasia
Que passa por mim, em meu viver.
Às vezes não tinha o que dizer,
Prisioneiro das circunstâncias,
Não por mim, pois tenho que crescer,
Não tenho riqueza, somente certeza,
De que sou assim e tenho prazer.
Criticam-me aqueles inúteis
Mas, isso não me traz tristeza
Em não seguir essa moda
Que esta convivência sem beleza
Impõe-me a praticar.
Com ousadia e certeza
De que a educação é meu lar
Diria eu nunca mais solidão
Por viver neste mundo com alguém:
Aquele que vive sem satisfação.
O quanto eu crescia
Percebia e sentia, sei,
Que nem tudo está perdido.
Vivo nesta casa faz anos
Sou um dos jovens do Brasil,
E por ser desse mundo insano
Registro no meu diário estudantil
O que vivi no Colégio Emiliano.
Análise do Texto
- O Aprendiz: Na primeira estrofe, o poeta apresenta-se como um aprendiz devido à sua condição de aluno de uma das mais importantes instituições de ensino da terra. Mesmo com toda felicidade aparente, o eu-lírico demonstrava-se iludido.
- As Cenas da Lição: Aos 14 anos de idade, F. J. Hora já tinha uma visão crítica sobre o modelo de ensino vigente naquela época, o que se acreditava ser o ensino moderno (escola sem memória antiga), o que ampliou os seus sonhos (projetos);
- Futuro do Brasil: Resume toda a efervescência de ideias e expectativas em torno do poeta;
- Um país de atormentados: Ora, a vida escolar e a vida social era muito estressante, não muito diferente de agora. Essa é uma crítica ao novo comportamento dos jovens ditados pela crescente indústria cultural;
- Um estranho por ali: Abrindo a mais enfática estrofe do poema, o poeta descreve o seu estranhamento diante daquela realidade que ultrapassava os limites da escola. As pessoas também se admiravam de uma figura, digamos, “prodigiosa e louca”.
- Os jovens em revolução: Aquele ano era de muitas expectativas, muita euforia, mitos e tabus. Os jovens estavam acomodados para os estudos, mas, fascinados pelas novidades que a era da informatização anunciava.
- Os mestres disfarçados: O verso mais polêmico do poema, causou reboliço na instituição de ensino, onde muitos vestiram a carapuça. O poeta criticou alguns professores da sua época que fingiam que ensinavam e os alunos fingiam que aprendiam;
- Sem projetos em construção: Não havia uma proposta de intervenção como resultado do ensino e ai segue a descrição: monótonos e sem precaução…;
- Valores aprendizes: No contexto, os valores aprendizes são a cultura escolar na visão dos estudantes e não do professor, ou seja, isso acabou influenciando a pedagogia da época;
- Prisioneiro das circunstâncias: Algumas particularidades da vida escolar de Flávio como se ele tivesse que ser sempre o vencedor, um herói e ao mesmo tempo invejado ou odiado.
- Criticam-me aqueles inúteis: Dirigiu-se a qual grupo: dos mestres, dos aprendizes ou da sociedade escolar como um todo? Pois bem, o eu-lírico quis dizer que as pessoas que lhe criticavam não tinham razão.
- Convivência sem beleza: O poeta relutava em seguir o que a moda da época ditava como comportamento padrão e aceitável sob pena de ser cafona ou demodê;
- A educação é meu lar: O poeta sentia-se feliz por estar em busca do conhecimento;
- Nunca mais solidão: O poeta encontrou alguém para dividir seus problemas, mas, essa pessoa vive sem satisfação, nesse caso, não se trata de paixão ou caso amoroso, mas, alguém de quem diverge sua ideias;
- Nem tudo está perdido: Apesar de tanta desilusão e conflitos encontrados na vida escolar, quiçá social, o poeta ainda assim cultiva a esperança.
CURIOSIDADES
O poema foi lido no dia 14 de Julho de 2000 por ocasião da comemoração dos 30 anos do Colégio Emiliano, o espaço retratado no poema.
Na época era diretor, o então Mestre Silvanio de Andrade, hoje Doutor.
Naquele mesmo ano, Flávio teria publicado uma única edição do periódico Gazeta do Emiliano, o que gerou polêmica por conta do antigo Jornal do Emiliano que era mais vendido por conter fofocas e não informações de interesse escolar.
Na Gazeta do Emiliano teve uma denúncia contra o prefeito da época, uma entrevista com o diretor Silvanio, um poema de F. J. Hora, horóscopo e curiosidades sobre ciências e assuntos diversos.
Em 2012, ao publicar seu primeiro livro, Poesia do Novo Tempo, F.J. Hora publicou o seu poema antológico.
Capa do primeiro livro, publicado pela Editora CBJE, Rio de Janeiro
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